O artigo a seguir foi escrito por um voluntário do Centro de Mídia Independente de São Paulo, sobre um encontro que teve com o referido grupo. Boa leitura!
Planka: movimento pela gratuidade do transporte (Suécia)
Por Pablo Ortellado - voluntário do CMI-SP (Email:: pablo@riseup.net)
No dia 13 de junho tive um encontro com os companheiros do movimento sueco Planka Nu (Viagem Grátis Já) em Estocolmo. Abaixo segue o relato da conversa.
O movimento tem por volta de 4 anos e, assim como o Passe Livre, demanda transporte gratuito para todos. A estratégia que eles adotam, no entanto, é única. Na Suécia, se você é pego no metrô ou ônibus sem bilhete, você toma uma multa (atualmente no valor de 800 Kronos, cerca de 240 reais). Como o custo de um passe mensal é de 650 Kronos (195 reais), não vale a pena arriscar. O que o Planka Nu vem fazendo, no último ano e meio, é constituir um fundo coletivo para pagar a multa caso quem viaja de graça seja detido. Funciona assim: o Planka fundou uma associação legalmente constituída e todo mundo pode se associar pagando uma mensalidade de 100 kronos (30 reais) no banco. Se você for pego viajando de graça, basta apresentar a multa para a associação e a associação paga a multa para você. É um seguro para pular a catraca.
O caráter único desta estratégia vem do fato de que na Suécia, viajar de graça não é exatamente um crime - a lei diz que se você for detido, você paga uma multa na forma de "tarifa complementar". Assim, a estratégia deles, a despeito das muitas críticas do governo e da direita, parece ser perfeitamente legal. Esse fundo, com o passar do tempo, se mostrou inclusive superavitário. Eles são hoje o único grupo autônomo que tem dinheiro em caixa e fazem sempre doações para outros movimentos, em particular o movimento em defesa dos imigrantes. Eles têm um pequeno escritório dividido com outros grupos onde recebem chamadas telefônicas das pessoas que foram detidas e prestam auxílio legal. Todo o trabalho é voluntário.
Atualmente, a associação tem 350 membros, mas esse número varia de mês a mês. Quando a passagem aumenta, o número de associados cresce e quando a passagem baixa, o número de associados cai. O grupo é formado por um núcleo duro de umas 4 pessoas que sempre participam das reuniões, mais umas 10 a 20 pessoas que vão e vêm.
Além do "seguro", o grupo também organiza manifestações, dá auxílio jurídico e faz uma campanha política permanente defendendo o transporte gratuito para todos. No dia seguinte ao que conversamos, eles fariam uma manifestação no órgão equivalente à câmara de vereadores contra um projeto de lei da direita que redirecionava as multas para quem violava o rodízio de carros no centro da cidade para a construção de rodovias (quando antes o dinheiro das multas ia para o transporte público). Eles também fazem uma campanha grande, distribuindo adesivos, fazendo camisetas, mochilas, etc. Além disso, eles têm um advogado voluntário que auxilia pessoas que sofreram abuso pela polícia pelo fato de estarem andando de graça (parece que todo mês acontece de alguém ser espancado). O fato do seguro ter um superávit permanente permite financiar todas essas atividades de propaganda com folga.
Pelo que eu pude ver, o Planka é um movimento conhecido no país. Sempre que acontece algo relacionado ao sistema público de transportes, eles são chamados pela imprensa para comentar (apenas um exemplo: outro dia a polícia retirou um camelô que trabalhava na entrada do metrô e a imprensa foi pedir a opinião do Planka). Eu também vi um vídeo-clipe muito legal de um rapper que foi feito para o Planka Nu a pedido do pessoal de Gotemburgo (link abaixo). Parece também que uma personalidade da TV Sueca (a primeira participante de um Big Brother a fazer sexo na frente das câmeras) fundou um partido (acho que meio como a Cicciolina na Itália) e convidou o Planka para participar da parte do programa relacionado a transportes. Embora a associação tenha só 350 pessoas, eles terminam sendo considerados os "representantes não oficiais" de todo um setor da população que viaja de graça. Segundo estimativas do próprio metrô, entre 6 e 10% da população viaja de graça.
Do ponto de vista político, o Planka defende um transporte gratuito para todos. Eles não têm conexões permanentes com os partidos políticos e vêem a sua tarefa não como a de propor leis, mas de pressionar os políticos a proporem leis. Muitos dos militantes vieram do movimento estudantil "sindicalista" (ou seja, ligado ao sindicato anarquista SAC - hoje com cerca de 10 mil associados), mas têm enfrentado dificuldades com alguns grupos anarquistas que os têm criticado. Eles não têm muito bem definido o modelo de transporte gratuito para todos que defendem. Têm apenas o princípio geral de que o transporte deve ser gratuito e financiado por um imposto progressivo (como o imposto de renda).
Atualmente, dois partidos apóiam "em teoria" a causa da gratuidade dos transportes: o Partido Verde e o Partido da Esquerda (antigo Partido Comunista). No entanto, esse apoio "teórico" não se transforma em propostas de lei efetivas, porque para propor leis a esquerda depende sempre do apoio do Partido Social Democrata (que governou a Suécia por 70 anos e recentemente saiu do poder) e o Partido Social Democrata não apóia a gratuidade. Eles também têm problemas com o sindicato estudantil (que, pelo que pude entender, é um corpo oficialmente eleito nas escolas e universidades) que luta pela expansão do desconto para estudantes (que é restrito a determinados horários) e vê a luta pela gratuidade como ameaça a sua estratégia.
A propósito, do ponto de vista estratégico, o Planka acredita que a viagem gratuita é equivalente a uma "greve dos transportes" - uma espécie de "greve dos consumidores". Eles também entendem que a estratégia deles é popular porque permite alcançar um objetivo concreto - é o estabelecimento de uma alternativa "aqui e agora". Essa estratégia, na avaliação deles, é próxima da dos internautas que baixam música gratuitamente (aliás, eles mencionaram que algumas pessoas do movimento pirata na Suécia esteve envolvido no Planka no começo da campanha).
O Planka Nu está bem estabelecido em Estocolmo e parece que um grupo em Gotemburgo também está consolidado, ainda que menor e menos influente. Eles tentaram expandir a experiência deles para outros países (como a Alemanha), mas nunca conseguiram. O principal entrave é que nos outros países viajar sem pagar a passagem é crime. Assim, embora haja ativistas que se interessam e lutam pela gratuidade dos transportes (eu mesmo tive notícia de um grupo em Paris), eles não encontraram como o Planka uma estratégica prática de ação. Um pouco por isso eles ficaram muito entusiasmados com o MPL, cujas lutas já tinham ouvido falar, mas acho que não sabiam que era um movimento organizado. Minha impressão é que valeria muito a pena o MPL estreitar os laços com o Planka.
O movimento tem por volta de 4 anos e, assim como o Passe Livre, demanda transporte gratuito para todos. A estratégia que eles adotam, no entanto, é única. Na Suécia, se você é pego no metrô ou ônibus sem bilhete, você toma uma multa (atualmente no valor de 800 Kronos, cerca de 240 reais). Como o custo de um passe mensal é de 650 Kronos (195 reais), não vale a pena arriscar. O que o Planka Nu vem fazendo, no último ano e meio, é constituir um fundo coletivo para pagar a multa caso quem viaja de graça seja detido. Funciona assim: o Planka fundou uma associação legalmente constituída e todo mundo pode se associar pagando uma mensalidade de 100 kronos (30 reais) no banco. Se você for pego viajando de graça, basta apresentar a multa para a associação e a associação paga a multa para você. É um seguro para pular a catraca.
O caráter único desta estratégia vem do fato de que na Suécia, viajar de graça não é exatamente um crime - a lei diz que se você for detido, você paga uma multa na forma de "tarifa complementar". Assim, a estratégia deles, a despeito das muitas críticas do governo e da direita, parece ser perfeitamente legal. Esse fundo, com o passar do tempo, se mostrou inclusive superavitário. Eles são hoje o único grupo autônomo que tem dinheiro em caixa e fazem sempre doações para outros movimentos, em particular o movimento em defesa dos imigrantes. Eles têm um pequeno escritório dividido com outros grupos onde recebem chamadas telefônicas das pessoas que foram detidas e prestam auxílio legal. Todo o trabalho é voluntário.
Atualmente, a associação tem 350 membros, mas esse número varia de mês a mês. Quando a passagem aumenta, o número de associados cresce e quando a passagem baixa, o número de associados cai. O grupo é formado por um núcleo duro de umas 4 pessoas que sempre participam das reuniões, mais umas 10 a 20 pessoas que vão e vêm.
Além do "seguro", o grupo também organiza manifestações, dá auxílio jurídico e faz uma campanha política permanente defendendo o transporte gratuito para todos. No dia seguinte ao que conversamos, eles fariam uma manifestação no órgão equivalente à câmara de vereadores contra um projeto de lei da direita que redirecionava as multas para quem violava o rodízio de carros no centro da cidade para a construção de rodovias (quando antes o dinheiro das multas ia para o transporte público). Eles também fazem uma campanha grande, distribuindo adesivos, fazendo camisetas, mochilas, etc. Além disso, eles têm um advogado voluntário que auxilia pessoas que sofreram abuso pela polícia pelo fato de estarem andando de graça (parece que todo mês acontece de alguém ser espancado). O fato do seguro ter um superávit permanente permite financiar todas essas atividades de propaganda com folga.
Pelo que eu pude ver, o Planka é um movimento conhecido no país. Sempre que acontece algo relacionado ao sistema público de transportes, eles são chamados pela imprensa para comentar (apenas um exemplo: outro dia a polícia retirou um camelô que trabalhava na entrada do metrô e a imprensa foi pedir a opinião do Planka). Eu também vi um vídeo-clipe muito legal de um rapper que foi feito para o Planka Nu a pedido do pessoal de Gotemburgo (link abaixo). Parece também que uma personalidade da TV Sueca (a primeira participante de um Big Brother a fazer sexo na frente das câmeras) fundou um partido (acho que meio como a Cicciolina na Itália) e convidou o Planka para participar da parte do programa relacionado a transportes. Embora a associação tenha só 350 pessoas, eles terminam sendo considerados os "representantes não oficiais" de todo um setor da população que viaja de graça. Segundo estimativas do próprio metrô, entre 6 e 10% da população viaja de graça.
Do ponto de vista político, o Planka defende um transporte gratuito para todos. Eles não têm conexões permanentes com os partidos políticos e vêem a sua tarefa não como a de propor leis, mas de pressionar os políticos a proporem leis. Muitos dos militantes vieram do movimento estudantil "sindicalista" (ou seja, ligado ao sindicato anarquista SAC - hoje com cerca de 10 mil associados), mas têm enfrentado dificuldades com alguns grupos anarquistas que os têm criticado. Eles não têm muito bem definido o modelo de transporte gratuito para todos que defendem. Têm apenas o princípio geral de que o transporte deve ser gratuito e financiado por um imposto progressivo (como o imposto de renda).
Atualmente, dois partidos apóiam "em teoria" a causa da gratuidade dos transportes: o Partido Verde e o Partido da Esquerda (antigo Partido Comunista). No entanto, esse apoio "teórico" não se transforma em propostas de lei efetivas, porque para propor leis a esquerda depende sempre do apoio do Partido Social Democrata (que governou a Suécia por 70 anos e recentemente saiu do poder) e o Partido Social Democrata não apóia a gratuidade. Eles também têm problemas com o sindicato estudantil (que, pelo que pude entender, é um corpo oficialmente eleito nas escolas e universidades) que luta pela expansão do desconto para estudantes (que é restrito a determinados horários) e vê a luta pela gratuidade como ameaça a sua estratégia.
A propósito, do ponto de vista estratégico, o Planka acredita que a viagem gratuita é equivalente a uma "greve dos transportes" - uma espécie de "greve dos consumidores". Eles também entendem que a estratégia deles é popular porque permite alcançar um objetivo concreto - é o estabelecimento de uma alternativa "aqui e agora". Essa estratégia, na avaliação deles, é próxima da dos internautas que baixam música gratuitamente (aliás, eles mencionaram que algumas pessoas do movimento pirata na Suécia esteve envolvido no Planka no começo da campanha).
O Planka Nu está bem estabelecido em Estocolmo e parece que um grupo em Gotemburgo também está consolidado, ainda que menor e menos influente. Eles tentaram expandir a experiência deles para outros países (como a Alemanha), mas nunca conseguiram. O principal entrave é que nos outros países viajar sem pagar a passagem é crime. Assim, embora haja ativistas que se interessam e lutam pela gratuidade dos transportes (eu mesmo tive notícia de um grupo em Paris), eles não encontraram como o Planka uma estratégica prática de ação. Um pouco por isso eles ficaram muito entusiasmados com o MPL, cujas lutas já tinham ouvido falar, mas acho que não sabiam que era um movimento organizado. Minha impressão é que valeria muito a pena o MPL estreitar os laços com o Planka.
Abaixo alguns links com maiores informações do Planka:
Site com informações em inglês:
http://www.planka.nu/eng
Breve informação em português:
http://www.planka.nu/international/no-portugus
Email: sthlm@planka.nu
Video do rapper Mofo "Join Us" sobre o Planka.Nu
http://youtube.com/watch?v=wHkeC8ZPuco
Artigo retirado do endereço: http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2007/06/386137.shtml
Um comentário:
Bom... viajar de graça seria bom, mas acho que o sistema de transporte sueco funciona perfeitamente. E se assim fosse, no brasil um dia, seria um sonho:
Bilhete único: Pagar 100 reais por um cartão mensal onde pudesse utilizar quantas vezes quisesse, pra onde quisesse dentro da cidade já seria muito bom.
Isso sem falar no sistema inter-estadual que tbm existe na Suécia. Um estudante(ou menor de 20 anos) pode também optar por pagar 160 reais aproximadamente, e viajar dentro do estado tbm quando quiser, desde que não utilize o mesmo durante de horário escolar.
Pra realidade da Suécia, esses preços são pechinchas... Agora se for comparar com o Brasil, no RIo por exemplo, onde nego ganha salário mínimo e passagem custa 2,20, é um absurdo. É chocante saber como as coisas funcionam em outros países e o descaso do governo quanto a máfia das empresas de transportes. (Na Suécia o transporte publico é do governo, assim como quase todos outros setores).
Mas enfim, esse post do Planka, é um exemplo de que nada nunca tá bom :) Não sou contra iniciativa deles, apesar de achar que o transporte já funciona muito bem. O único problema na proposta deles é fazer a sociedade aceitar mais imposto. O que é hoje a principal crítica lá, já que a Suécia é hoje um dos países onde mais se paga imposto, porém com uma enorme diferença sobre o Brasil. Lá o dinheiro do imposto volta, no brasil vôa.
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