quarta-feira, agosto 24, 2005

Sobre a repressão política ao Movimento Passe Livre no Distrito Federal

Por d. MPL-Floripa


Em meio à enxurrada de notícias sobre a profunda crise política que abala o governo federal, temos a impressão de que nada mais acontece mundo afora e que o projeto político de esquerda sucumbiu à mesmice, à podridão que desde antes já existia. Contudo, movimentações por todo o
país demonstram que a organização da população para dar um basta à exploração política e econômica não pode e não está atrelada ao calendário eleitoral, a este buraco negro no qual quem ousa entrar prova não conseguir sair. Os projetos políticos da esquerda, a socialização da produção, o fim da exploração por conseqüência da propriedade privada e o patronato e, claro, a liberdade, em nada se confunde com o sistema que está colocado, que representa sim o mercado e a manutenção do status quo, mas não a população, que pode e deve representar a si mesma, através da democracia direta.


Prova disso é a consolidação nacional do Movimento Passe Livre (MPL), que em julho realizou seu 2º Encontro Nacional em Campinas, com a participação de 20 cidades de praticamente todos os cantos do país. Um movimento independente, horizontal e apartidário, que vem semeando a luta pelo fim da mercantilização do transporte coletivo, abrindo novas perspectivas de luta para a juventude e a população. Curitiba, Maracanaú, Vitória da Conquista, Florianópolis e Vitória, são apenas exemplos recentes onde a população se levantou – nas duas últimas cidades conquistando a redução nas tarifas de ônibus.


Outro local que se destaca neste cenário é o Distrito Federal (DF). Após uma mobilização dos trabalhadores rodoviários, que por fim garantiu uma série de conquistas, em julho, os empresários de ônibus exigiram que o Governo do DF concedesse um reajuste de 42% nas tarifas. Assim, as
linhas internas do plano piloto passariam de R$ 1,60 para R$ 2,50 e as linhas que ligam o plano piloto às cidades satélites de R$ 2,50 para R$3,50. O MPL do DF inicia, então, uma jornada de lutas. Bloqueiam importantes vias da cidade e chegam a ocupar o órgão administrador do
transporte. Enquanto isso, as linhas que operam nas cidades do entorno sofrem reajuste de 11,9%, dando a entender que o DF não escaparia da decisão dos empresários do transporte. O reajuste foi concedido pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), mesmo considerando o serviço prestado pelas empresas de ônibus como “abaixo do esperado” e a despeito das necessidades da população que, segundo dados do IBGE, tem no transporte um de seus maiores gastos mensais.


O MPL, avaliando que é a população quem deve ser beneficiada e não meia dúzia de empresários, prosseguiu sua jornada de lutas. No Distrito Federal a situação chega a ser drástica. As empresas são divididas em três grupos. O primeiro é dirigido por Valmir Amaral, político conhecido pelos seus 65 processos cíveis, trabalhistas e da fazenda que tramitam na Justiça de Brasília, além de outros dois, do TRF, segundo matéria publicada no site da revista IstoÉ. O segundo grupo, das empresas do entorno, é comandado pela família Matsunaga, que volta e meia assume falência, deixa os trabalhadores assumirem o controle para depois retornar em melhores condições. E o último pedaço fica por conta de Wagner Canhedo, também político local, presidente do sindicato patronal
e notório personagem no caso da enorme dívida de R$ 254 milhões da Vasp com o INSS – motivo pelo qual chegou a ser detido.


A nova etapa da jornada iniciou no dia 15 de agosto. Novamente o protesto foi realizado em importantes vias e na rodoviária. Desta vez, a polícia investiu por duas vezes contra os manifestantes, resultando em dezenas de feridos e dois detidos sob falsa acusação de depredação de
patrimônio público. Uma estudante foi detida sob uma acusação inventada a tal ponto que a própria secretaria da Delegacia da Criança e do Adolescente recusou-se a aceitar a queixa. As três pessoas detidas foram liberadas ao fim da noite e, assim como os demais feridos, foram ao
Instituto Médico Legal prestar queixa.


Trata-se não apenas de um protesto pontual, mas de levar a cabo a máxima de que as ruas pertencem às pessoas – mesmo que Brasília tenha sido desenvolvida para que não o fossem. No dia 16 os manifestantes pararam a rodoviária e dançaram, como em um bloco de carnaval de rua. Nada mais perigoso do que dezenas de populares, estudantes ou não, retomando o papel de protagonistas nos espaços públicos, e pior, reivindicando algo concreto e se organizando para tal. A polícia novamente foi acionada e no dia seguinte, enquanto eram exibidos vídeos da luta pela
desmercantilização do transporte coletivo e pelo passe livre em todo o Brasil, as forças da repressão foram chamadas para impedir insustentável absurdo. Mais quatro detidos. O enredo já conhecemos: spray de pimenta, cassetetes e intimidação. Um rapaz foi brutalmente espancado.


Fatos lamentáveis como estes não podem voltar a se repetir em lugar algum. Depoimentos e vídeos estão sendo encaminhados para entidades de direitos humanos. A juventude está se organizando para que este tipo de acontecimento, a violência do Estado, não seja interpretado como um fato isolado. O MPL do Distrito Federal compõe uma coletividade que alcança as cidades mais remotas do Brasil, do Rio Grande do Sul à Rondônia. O movimento está atento para combater este tipo de autoritarismo. Nas palavras do coletivo do Distrito Federal: "toda hora é hora de mobilização: o local é onde você está e quem organiza é você. Pare a cidade antes que ela te pare. Por uma vida sem catracas".

Um comentário:

Anônimo disse...

gostei do texto e concordo com a movimentação e com a luta diária e apesar de agora não poder participar ativamente com o grupo fornece todo o meu apoio. para a causa e para acabar com essa repressão policial absurda.

danielle